Se eu morasse no Paquistão seria muito fácil. Assim que eu descobrisse que minha filha adolescente andava saindo com um namoradinho do bairro próximo, eu a encheria de chumbo.
Não teria conversa fiada. "É verdade que você anda saindo com o Salim?"
"É? Pois acabou". Pegava o trinta e oito e resolvia o problema com um tiro no meio da fuça. Pá. Pronto. A honra da família estava lavada.
Violento, eu? Não. É apenas uma brincadeira. Um exercício de imaginação. Eu não moro no Paquistão (e nem em Londres), não me chamo Arif Mubashir, e não tenho um trinta e oito.
Arif Mubashir, de Faisalabad, no Paquistão, é um cara decidido. Arif não tinha uma filha adolescente. Ele tinha seis filhas adolescentes.
Seis, meus amigos: 1, 2, 3, 4, 5 e 6.
Pois agora ele não tem mais nenhuma. Mas a honra da família dele está limpinha, como zero quilômetro.
Mas ele também tem seis filhas a menos.
Tudo começou quando as moçoilas começaram a ficar grandinhas e, claro, mesmo no Paquistão, um dos países mais perigosos para as mulheres devido a um atroz conservadorismo islâmico, elas começaram a olhar para rapazes. Como é de praxe.
Mas, pior que isso, ao invés de apenas olharem, de esguelha, para o sêo Arif não perceber, foram logo se engraçar, duas delas, com dois moçoilos namoradores.
Daí que o sêo Arif ficou sabendo. Como? Não me perguntem, isso eu não sei. Mas imagino.
O ser humano é muito parecido, em toda a parte. Garante que algum fofoqueiro de plantão viu ou soube do caso das duas filhas dele com dois rapazes e foi falar: Sêo Arif, a honra da sua família foi pro brejo. As suas filhas Sameena e Razia estão se engraçando com dois jovens do outro bairro.
Pronto. Isso bastou para deixar o sêo Arif em fúria. Ele não planejou matar alguém por três anos como o louco da Noruega que não gosta de islâmicos, o Anders Behring Breivik. Não, o sêo Arif tem o pavio curto, e o trinta e oito dele um cano longo. Assim que ele foi tirar a história a limpo.
Perguntou para a irmã mais velha se era verdade que Sameena (14 anos) e Razia (16) estavam se engraçando com uns rapazes. A menina acabou confirmando. Todas as outras quatro irmãs sabiam, mas estavam protegendo as duas namoradeiras.
Ah, é? É assim que pensam que isto vai acabar?
Sêo Arif mandou reunir a família. Reunião solene. Na sala da casa. Quando sêo Arif manda ninguém ousa discordar. É lei. É assim em grande parte do Paquistão, e de muitos outros países islâmicos. Os homens mandam muito. Mandam demais. Mandam prá cachorro. (êpa, cachorro não que seu Arif não gosta, é um bicho muito sujo).
Pois bem. Família reunida.
Sêo Arif, com os olhos rútilos de indignação (um pouco de Nelson Rodrigues sempre é bom) avisa o motivo da reunião.
Sameena e Razia desonraram a família.
Oh!!!!!!!!!!!!
E as outra quatro, que sabiam de tudo, também.
Oh!!!!!!!!!
E assim, para que tudo voltasse ao normal, e a honra da família voltasse ao que sempre foi, o sêo Arif Mubashir não titubeou.
Puxou o gatilho seis vezes.
Seis estrondos intermináveis estrondos, compassadamente:
Pá. Pá. Pá. Pá. Pá. Pá.
Ao fim do último tiro, as seis filhas de Arif Mubashir estavam mortas.
Mas ele estava com a honra lavada. Nem com Omo ficaria mais limpinha.
Tem muita diferença do Anders Behering Breivik, o louco de Oslo, que matou nove em uma explosão e depois mais 68 a tiros, para protestar contra o multiculturalismo?
Anders queria era dizer que não gostava dos métodos aceitáveis dentro da cultura paquistanesa, por exemplo, de um pai lavar a honra da família matando suas filhas a tiros. Métodos assim que muito imigrantes estão levando e querendo impor aos europeus. Leiam sobre Londres. Paris, Barcelona.
Como Anders é claramente um louco, ele estava certo na crítica, mas absolutamente errado no método. Tão errado quanto o sêo Arif que matou seis filhas de uma vez.
E ninguém no Paquistão diz que Arif é um louco. Diz apenas que ele lavou a honra da família.
Dá para exportar essa mentalidade para Londres, Paris ou Oslo?
Se você acha que sim, então você é um multiculturalista e não sabia. Percebe como a coisa pode ser meio complicada?
PS. Embora lavar a honra com a morte do outro seja comum no Paquistão (mais de 600 mulheres morreram em 2009 por causa disso), a civilização vai chegando e agora isso pode dar cadeia.
O sêo Arif está preso. Mas as filhas continuam mortas.
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