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terça-feira, 10 de janeiro de 2012

ESPERANDO GODOT, OU HADDAD, NA CRACOLÂNDIA. Como a miséria humana serve ao espetáculo eleitoral.

CRACOLÂNDIA, SP (Foto Internet)

Quando falamos de Cracolândia, estando em São Paulo, sabemos que fica na região central da cidade, perto das antigas estações de trens. Mas, em dezenas de cidades brasileiras existem cracolândias, igualmente conhecidas de suas populações, algumas funcionando há anos.

Para muitos é uma chaga, que precisa ser tratada.

Para outros, talvez, um meio de vida: traficantes e ongueiros que vivem, muitos, de cultivar a chaga. Uma boa chaga, como aquelas de antigos esmoleres, não deve ser curada, precisa ser cultivada para continuar boa para ser exposta e gerar a comiseração do povo, e ótimas esmolas.

Assim, as cracolândias do Brasil, e estão espalhadas democraticamente pelo país, são alvos de tensões. Há o que querem o combate ao tráfico. Há os que se compadecem dos viciados. Os que querem o combate ao tráfico sabem que a facilidade com que os bandidos oferecem drogas aos jovens é uma tentação para entrar na criminalidade.

Os que pretendem atender aos doentes (os viciados são chamados de doentes) querem que a sociedade gaste seus impostos em atendimento social, médico e psicológico com os usuários de drogas, mas não querem dificultar a entrada dos jovens no mundo das drogas.

Ora, se as drogas circulam facilmente, se bandidos não vão presos (são infelizes que não conseguiram emprego, dizem...) e quem se vicia ainda recebe tratamento com grana do contribuinte, como se viciar fosse destino, a coisa fica interessante.

Quase nada é feito, concretamente, para impedir o surgimento de cracolândias. Há cracolândia pertinho, até, do centro do poder, em Brasília. Mas o governo federal, diante de tantos desmandos e problemas que enfrenta com seus ministros talvez não possa reparar na própria cracolândia vizinha, razão pela qual espicha os olhos gulosos para a cracolândia paulista, como revelou o Estadão.

A cracolândia paulista é valiosa, inchada, atraente. São quatrocentas, quinhentas pessoas viciadas, em total degradação humana, em ambientes impróprios para ratos e vermes. Mas o ambiente é excelente para políticos demagogos e oportunistas.

Em ano eleitoral a coisa fica ainda melhor. Matérias da imprensa vêm mostrando a situação paulista e de outros lugares, porém o crack se espalha sem cessar pelo País. Provém de restos da cocaína que, por sua vez, vem do exterior (mas este é outro problema). Aliás, o duro combate ao crack foi, se não me engano, uma das grandes promessas da campanha de presidente Dilma Rousseff. Mas a campanha já acabou faz tanto tempo...

Como a Polícia Militar detonou a operação de intervenção na Cracolândia, para prender traficantes ou dificultar a sua ação (pois em São Paulo bandidos vão para a cadeia), muita gente ficou indignada. ONGs, promotores públicos, advogados públicos, comentaristas da imprensa.

Repentinamente o alvo das queixas de tais pessoas passou a ser a PM de São Paulo! Ora, eu já achava que a situação tinha passado do ponto crítico. Quando a polícia age é criticada? Li que uma usuária, que teria sido atingida por uma bala de borracha da PM na boca registrou queixa, em um BO, por... tortura! Uau!

Imagem a seguinte cena:

Ônibus cheios de policiais chegam na Luz e desembarcam 400 policiais militares. Cada um vem absolutamente desarmado, nem com spray de pimenta. Todos portando uma rosa, sem espinhos, para não ferir ninguém.

“Meu Sr. Desculpe interromper sua cachimbada tão bacana mas quero me apresentar. Meu nome é PM Bastião e quero lhe entregar esta rosa para que saiba que está em nosso coração. Assim que acabar de fumar e quiser bater um papinho venha até o nosso quiosque, lá temos mais flores. (Menos cravos vermelhos, por óbvio)”.

Policiais femininas, portando rosas brancas, procurariam as moças e aguardariam que elas terminassem suas baforadas para uns fiapos de prosa. Isso caso estivessem dispostas. Senão, as policiais voltariam na manhã seguinte, claro.

Assim, entre rosas e fiapos de prosa a PM estabeleceria amizade com os usuários, mas não muito, para não enciumar os padres de passeata, os ongueiros militantes, os promotores enfezados porque a polícia é polícia, mas que não voltam os olhos para os traficantes. Pelo que li, os críticos da ação da PM querem mais conversa. Conversar é preciso. 

Nisso contaríamos uns três ou quatro anos mais, a Cracolândia seria tema de teses acadêmicas, de mestrados, doutorados, ensaios, e documentários. Também teria dois ou três mil usuários e ocuparia várias quadras. Talvez até pudessem os usuários fazer uma escola de samba e sair no Carnaval. Claro que o financiamento, para não dar na vista, seria feito por bicheiros e não traficantes.

Pensando no Rio de Janeiro, talvez alguns Toyotas pudessem ser daptados para o turismo, como nos morros cariocas, para circular gringos curiosos sobre a Cracolândia.

Acontece que, não sei por que motivos, mas a PM recebeu orientação -até tardia demais- para acabar com a festa na Cracolândia, no que fez muito bem. Agora vem o rescaldo.

Claro, quem imaginava chegar em São Paulo de mãozinha dada com o ex-presidente,  em abril, dando uma de galo, arrastando as asinhas e  faturando em votos a limpeza da Cracolândia está ainda em Brasília.

Mas vai ter que pensar em outra coisa. Os votinhos pelo ataque à Cracolândia não terá. Não terá mesmo. Terá que ficar esperando Godot, ou Haddad...

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