Todo dia. Todo dia a mesma coisa. Todo dia ao abrir os olhos, o mesmo teto, do mesmo jeito. Uma dor profunda, um sofrimento atroz. Todo dia grudado, colado naquela cama, cheio de feridas pelo corpo. E obrigado a olhar sempre para o mesmo lugar, sem mexer um único dedo. A mulher e o filho pequeno (oito anos) foram embora de casa, pois a mulher não aguentava mais cuidar de Geraldo. Geraldo Rodrigues de Oliveira tinha 28 anos de idade, morava no Jardim Novo I, e morreu na madrugada do dia 22 de Outubro, sábado.
O crime revoltou a população de Rio Claro. Como um sujeito teve a coragem de entrar na casa de alguém para roubar e ainda mata com dois tiros uma pessoa indefesa, doente, ferida, tetraplégica, que apenas mexia seus olhos? Quanta maldade. Um tiro na cabeça e um no pescoço. A população ficou muito revoltada, pois este foi o terceiro latrocínio do ano na cidade, segundo a imprensa. Geraldo Rodrigues Oliveira morreu e o assaltante levou ainda R$ 800,00.
Segundo a polícia apurou, Geraldo não estava só. Havia com ele um sobrinho, de 15 anos, que o auxiliava. Era pouco mais de uma hora da madrugada de sábado. Repentinamente um sujeito encapuzado apareceu. Havia invadido a casa por uma porta do fundo e estava armado com um revólver.
Insistiu que queria dinheiro e jóias. Ameaçou matar Geraldo com a arma encostada em sua cabeça. O que fazer? Geraldo falou para o sobrinho pegar em algum lugar ali no quarto um maço com R$800,00, que serviriam para a compra de alimentos e remédios. O ladrão vendo que havia dinheiro insistiu, e quis mais valores. Irritou-se com a demora e deu dois tiros em Geraldo.
Geraldo morreu na hora, com um tiro na cabeça e outro no pescoço. O ladrão fugiu. A notícia se espalhou e Rio Claro ficou revoltada.
MISTÉRIOS DA VIDA
Certamente em 2009, antes de sofrer o acidente e ficar tetraplégico, Geraldo não queria morrer. Brincava com seu filho, tinha a sua jovem mulher. Tinha outros irmãos. Gostava de se divertir, como qualquer um. Mas a vida é cheia de surpresas. Esse é o encanto, ou o mistério da vida.
Num belo dia Geraldo, Roberto Rodrigues de Oliveira (seu irmão) e outras pessoas estavam em um churrasco e, certamente animados por algumas cervejas, como é comum no interior, Roberto resolveu chamar Geraldo para uma corrida, "um racha" entre carro e moto. Roberto pilotava a moto, Geraldo o carro. Esses tais rachas são comuns no interior. Em alguns lugares há longas avenidas asfaltadas, ruas desertas, estradas de terra.
Um desafio: é sim ou não. Geraldo respondeu que sim. Os antigos gregos e romanos acreditavam na existência da deusa Fortuna. Ela ficava pelo mundo a segurar uma pequena roda que girava quando acionada e parava em um nome (como a roda de um cassino). O nome sorteado teria sorte ou azar.
Naquele dia Geraldo foi contemplado com o Azar. E o azar foi escapar da Morte, e ficar tetraplégico. Isso foi um motivo de grande amargura para ele. Ele achava que já não tivera muita sorte com o filho que era paraplégico.
Desde então reclamava da falta de sorte e de seu irmão Roberto, a quem culpava pelo acidente. Ambos deram partida e estavam "rachando" mas, em um momento, Geraldo, não se sabe porquê, perdeu o controle do carro e este capotou. Geraldo acabou tetraplégico. Pai e filho com problemas. Um grande sacrifício para a esposa e mãe. A situação psicológica de Geraldo piorou muito quando, no início deste ano, um outro irmão morreu em um acidente de moto.
Foi, praticamente, o fim da vida para Geraldo. Colado a uma cama, sem poder mexer um músculo. Seu casamento acabou, a esposa foi embora com o filho, após muita insistência. Geraldo passou a morar com Roberto e com um sobrinho. A polícia apurou que Geraldo reclamava demais e pediu que lhe dessem veneno. Queria morrer.
Como dar veneno indicaria um crime, pois Geraldo não se movia, como poderia ter tomado veneno? Roberto arquitetou um plano para matar o irmão. No fundo, segundo contou à polícia, após ser preso, sentia-se culpado pela situação de Geraldo. Alguns dias antes comprou um revólver e traçou o plano do assalto.
Após a morte de Geraldo, a polícia começou a investigar e acabou descobrindo a verdade. Só não descobriu ainda o capuz e a arma que Geraldo disse haver jogado em um rio.
Foi assim que, dois anos após o sorteio de Fortuna que a Morte veio buscar Geraldo.
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