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sexta-feira, 4 de março de 2011

OS ARQUIVOS SECRETOS DE MOSCOU. O desinteresse do mundo pelas 150 milhões de mortes


Uma História oculta do Mal

Claire Berlinski: City Journal, primavera de 2010

Embora Mikhail Gorbatchev seja idolatrado no
Ocidente, os arquivos ainda não traduzidos sugerem
uma figura muito mais sombria
Na consciência coletiva do mundo, a palavra "nazista" é um sinônimo do mal. É amplamente reconhecido que a ideologia dos nazistas - nacionalismo, anti-semitismo, o estado autárquico, o conceito do Führer - levou diretamente aos fornos de Auschwitz. Não se reconheceu tão bem, nem de longe, que o comunismo levou, de forma igualmente inexorável, em todas as partes do globo onde foi aplicado, a fome, tortura e campos de trabalho escravo. 

E nem  é amplamente reconhecido que o comunismo foi responsável pela morte de uns 150 milhões de seres humanos durante o século 20. O mundo permanece inexplicavelmente indiferente e desinteressado a respeito da mais mortífera ideologia na história da humanidade.

Como prova desta indiferença, considere os arquivos soviéticos, que ninguém leu. Pavel Stroilov, um russo exilado em Londres, tem em seu computador 50 000 documentos super-secretos do Kremlin, ainda não traduzidos nem publicados, a maioria datando do final da Guerra Fria. Ele os roubou em 2003 e fugiu da Rússia. Muitos ainda se lembram de um tempo em que eles teriam valido milhões para a CIA; eles certamente contam uma história do comunismo e seu colapso que o mundo precisa conhecer. E no entanto, ele não consegue encontrar ninguém que os recolha a uma biblioteca de reputação, publique-os ou financie sua tradução. Na verdade, ele não consegue encontrar  ninguém que se tenha lá muito interesse neles.

E há o dissidente soviético Vladimir Bukovsky, que já passou 12 anos nas prisões, campos de trabalho e psikhushkas - hospitais psiquiátricos políticos - da URSS, após ser condenado por reproduzir literatura anti-soviética. Também ele possui uma enorme coleção de documentos roubados e contrabandeados dos arquivos do Comitê Central do Partido Comunista, os quais, como diz ele, "contêm as origens e os fins de todas as tragédias de nosso século sangrento."

Estes documentos estão disponíveis online em bukovsky-archives.net*, mas a maioria não está traduzida. Eles estão desorganizados; não há sumários; não há um mecanismo de busca ou um índice. "Eu os ofereço de graça para os mais influentes jornais e periódicos do mundo, mas ninguém quer publicá-los," diz Bukovsky. "Os editores dão de ombros com indiferença: E daí? Quem liga para isso?”

Os originais da maioria dos documentos de Stroilov continuam nos arquivos do Kremlin, onde, como a maior parte dos documentos super-secretos do período pós-Stálin da União Soviética, eles continuam vetados ao público. Eles incluem, diz Stroilov, transcrições de quase todas as conversas entre Gorbachev e seus homólogos estrangeiros - centenas deles: um registro diplomático quase completo de uma era e que não está disponível em nenhum outro lugar.

Há observações do Politburo anotadas por Georgy Shakhazarov, um assessor de Gorbachev, e pelo membro do Politburo Vadim Medvedev. Há o diário de Anatoly Chernyaev — o principal assessor de Gorbachev e vice-líder do órgão conhecido antigamente como o Comintern — o qual vai de 1972 até a queda do regime. Há relatórios dos anos 60 da autoria de Vadim Zagladin, vice-líder do Departamento Internacional do Comitê Central até 1987 e consultor de Gorbachev até 1991. Zagladin era tanto diplomata quanto espião, encarregado de coletar informações secretas, espalhar desinformação e promover a influência soviética.
Quando Gorbachev e seus assessores foram removidos do Kremlin, eles levaram consigo cópias não-autorizadas destes documentos. Os documentos foram escaneados e arquivados nos arquivos da Fundação Gorbachev, um dos primeiros think tanks da Rússia moderna, onde um punhado de pesquisadores simpáticos e selecionados tiveram acesso limitado a eles. Então, em 1999, a fundação abriu uma pequena parte do arquivo a pesquisadores independentes, incluindo Stroilov. As partes centrais da coleção permaneceram restritas; os documentos só podiam ser copiados com a autorização por escrito do autor e Gorbachev recusava-se a autorizar quaisquer cópias que fossem. Mas havia uma falha na segurança da fundação, como Stroilov explicou para mim.

Quando havia algo de errado com os computadores, como frequentemente ocorria, ele conseguia ver o responsável pela área de informática digitar a senha que dava acesso à rede da fundação. Lentamente e em segredo, Stroilov copiou o arquivo e o enviou para locais seguros em várias partes do mundo.
Na primeira vez em que ouvi falar dos documentos de Stroilov, perguntei-me se não seriam falsificações. Mas em 2006, tendo avaliado os documentos com a cooperação de proeminentes dissidentes soviéticos e espiões da época da Guerra Fria, alguns juízes britânicos concluíram que podia-se acreditar em Stroilov e deram aval a seu pedido de asilo político. Desde então a própria Fundação Gorbatchev reconhece a autenticidade dos documentos.

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