O grande metamorfose ambulante, já chamado de deus por Marta
Suplicy, aquele que saiu com mais de cem por cento de aprovação do governo, reinventor
do Brasil, Lula, sim é dele que falo, acredita que é o santo das causas
perdidas, o semeador de postes.
Sim, Fernando Haddad foi eleito em São Paulo, com um terço
dos votos do eleitorado total. Outro terço não votou em ninguém. Creio que,
apesar da interpretação contrária de petistas, o mensalão pesou, sim, nestas
eleições. Haddad não foi eleito pela maioria.
Por que o Mensalão não pesaria? O povo acha que ser corrupto
é normal? Este não é o pais onde agora existe a Lei da Ficha Limpa? Este não foi,
ao menos até recentemente, o pais do partido dono da Ética, o próprio PT?
Assim como Lula não pode dizer que o paulista é idiota e não
liga para o Mensalão, o que dirá sobre as vexaminosas derrotas que sofreu em
Manaus, em Salvador, em Campinas, em Diadema, e em outras capitais e cidades medias?
Que foi culpa do Mensalão?
No primeiro turno o PT já havia sido derrotado
fragorosamente em Porto Alegre e de forma estrondosa em Recife, onde Lula impôs seu candidato na marra. Assim como em São Paulo, onde deixou Marta furiosa (bem, nem tanto, só até ganhar um ministério). Aí, relaxa e goza.
Lula não pode provar que o PT não foi afetado pelo Mensalão em
São Paulo, assim como não pode provar que a derrota de seu partido em outras
cidades importantes do Brasil não tem nada a ver com o mesmo escândalo. Embora
eleições municipais sejam caracterizadas por um eleitorado mais focado nos
problemas de seu quintal, creio que muita gente um pouco mais informada já está
cheia de ver a política tomada por corruptos.
Abaixo, um interessante artigo de Ricardo Noblat sobre a
interferência de Lula no segundo turno publicado em O Globo.
EM CAUSA PRÓPRIA
Ricardo Noblat
Que tal? Fica combinado assim: Lula foi o vencedor da
eleição para prefeito da cidade de São Paulo. Lula, e não Fernando Haddad que
nunca disputara eleição.
O PT? Não, gente - Lula. Porque o PT reagiu à arriscada
proposta de Lula de ir à luta com um candidato jovem e desconhecido dos
paulistanos. Lula foi obrigado a arquivar os bons modos: espancou a mesa e
forçou o PT a se render à sua vontade.
Os paulistanos? Não. Lula. Por que o que teria sido deles se
Lula, o esperto, não lhes tivesse proporcionado a oportunidade de votar em
Haddad?
Fica combinado também que Lula nada tem a ver com as
derrotas colhidas pelos candidatos que apoiou em outras cidades. Nem mesmo por
aqueles que Lula se empenhou de fato em eleger - gravou mensagens para os programas
de propaganda eleitoral no rádio e na televisão, pontificou em comícios e
passeatas, e repetiu a dose ao perceber que a primeira não fora suficiente.
Vocês imaginam o quê de Lula? Que ele é milagreiro para sair
por aí acendendo todo tipo de poste?
Lula acreditou que Vanessa Grazziotin, candidata do PC do B
a prefeita de Manaus, não era um poste. E não era. Foi vereadora, deputada estadual e federal. E há dois anos
se elegeu senadora derrotando Arthur Virgílio, na época o todo-poderoso líder
do PSDB no Senado. O governador do Estado apoiava Vanessa. Eduardo Braga
(PMDB), líder do governo Dilma no Senado, também. Fora os principais grupos
econômicos e de comunicação locais.
Lula deve ter pensado: por que não pegar carona numa vitória
quase certa para assim poder humilhar Arthur?
Foi direto e franco. No bairro mais popular de Manaus, disse
que estava ali menos por Vanessa e mais por Arthur. Acusou Arthur de um dia
tê-lo ameaçado com uma surra. E pediu para que ninguém votasse nele. Pediu,
não, cobrou, exigiu, ordenou. Os manauaras não gostaram. Não gostam de quem
quer mandar neles.
A cidade havia dado a Arthur a maioria dos seus votos para
reconduzi-lo ao Senado. Vanessa acabara eleita com os votos do interior. Manaus emitia todos os sinais de que votaria de novo em
Arthur. Por gostar dele. E como forma de reparação. Lula despachou Dilma para lá há uma semana. Deu chabu.
Vanessa subiu somente um pontinho nas pesquisas de intenção de voto.
Arthur
ganhou, ontem, com folga.
A pedido de Lula que fora a Salvador duas vezes, Dilma
desembarcou por lá para barrar a eleição de ACM Neto (DEM). E atacou-o sem dó
nem piedade.
Ao lado de Nelson Pelegrino, o candidato do PT em apuros,
Dilma bateu da cintura para baixo:
- Aqui não pode ter um governinho.
E insistiu:
- Aqui não pode ter um governo pequenininho.
ACM Neto mede menos de 1m65cm.
Pesquisas para consumo interno da campanha do candidato do
PT mostraram que os moradores de Salvador se irritaram com o que ouviram de
Dilma.
Mexer com uma característica física do adversário? O que é
isso, meu irmão? E se ACM Neto tivesse respondido: Precisamos em Brasília de um
governo mais enxuto, mais leve, mais ágil...?
A maior lambança promovida pelo PT nesta eleição foi no
Recife, cidade que governa há quase 12 anos.
Como o prefeito era mal avaliado, Lula indicou o senador
Humberto Costa para concorrer à vaga dele. Esqueceu-se de combinar com Eduardo
Campos, governador de Pernambuco e presidente do PSB.
Na véspera de anunciar que a candidatura de Humberto teria seu
patrocínio, Lula recebeu um telefonema de Eduardo:
- Presidente, estou ligando da sala onde meu avô, em 1964,
recebeu dois militares, um deles armado com uma metralhadora, quando vieram
depô-lo.
O avô de Eduardo, Miguel Arraes, era governador de Pernambuco.
Acabou preso e exilado.
Eduardo continuou o que queria dizer a Lula.
- Naquela noite, havia nove crianças dormindo aqui no
Palácio. Meu avô disse aos militares: "Vocês me prenderão e me levarão
daqui. Mas eu não renunciarei ao mandato de governador de Pernambuco".
Lula entendeu o recado e ainda argumentou com Eduardo que o
candidato poderia não ser Humberto. Mas Eduardo sabia que o PT reservara espaço
no programa do radialista Geraldo Freire para Lula anunciar no dia seguinte a
candidatura de Humberto.
O PSB de Eduardo lançou candidato a prefeito e o elegeu no
primeiro turno.
Lula fez cara de paisagem. Eduardo fez cara de aspirante a
candidato a presidente da República.
O desastre do PT no Recife, Salvador, Fortaleza, Diadema e
Campinas, e a vitória do PSDB em Manaus não significam que Lula e Dilma estejam
em baixa nas cidades onde apostaram o grosso de suas fichas.
Longe disso.
Significa apenas o que o marqueteiro mais iniciante já sabe
de cor: eleição municipal é um fenômeno local, local, local.
As pessoas votam em quem possa governar bem o lugar onde
elas vivem.
No caso de São Paulo, cansadas de Serra, elas o trocaram por
Russomano.
Serra bateu o recorde da rejeição - 52%. Nem Maluf jamais
foi tão rejeitado.
Mais tarde, decepcionadas com Russomano, aderiram a Haddad.
Uma fatia enorme se absteve ou votou nulo e em branco.
Não foi por Lula que elegeram Haddad. Basicamente, foi por
elas mesmas.
ARTIGO DE RICARDO NOBLAT
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