“Pessoas com pouco ou nenhum sentimento não conseguem reagir
às situações com um julgamento valorativo humano adequado. Graças a essa falha
é que elas têm maior probabilidade de se tornarem instrumentos do mal.” ( John
A. Sanford – Mal, o lado sombrio da realidade).
Araçagi fica numa região de caatinga, tem 17 mil habitantes
e suas raízes estão longe no tempo, em meados do Século XVIII. Como em muitas
outras partes do Brasil interior, muitas coisas não parecem mudar de modo
significativo. Uma delas é o hábito de muita gente andar armado com faca. Outro,
que não chega a ser um hábito, mas é um traço dos antigos lugares sem lei, e o
sujeito fazer justiça com as próprias mãos. Alguém olha para alguém de modo
torto e pronto, pode ter arranjado uma grande confusão.
A história que envolveu Jardiel Manoel da Silva, 18 anos, conhecido
como “Pelé”, e Ednaldo Melo, 20 anos, que todos conheciam por “Orelhinha”, não
foi muito diferente. Ah!, a falta do que fazer!
Não que por ali não exista trabalho na roça, pois Araçagi tem muito abacaxi, milho, feijão, cana de açúcar.
Mas às vezes alguns preferem ficar de conversa mole em botecos, e a tempestade
pode surgir de uma hora para outra.
Aí tudo se resolve na faca, na foice, no machado.
Deus do Céu, não poderia ter sido diferente nesta horripilante
história. E, como em tantas outras ocasiões, sempre há um rabo de saia.
Conta o povo que Jardiel, cara enfezado, e já conhecido por
algumas confusões, estava na plantação de abacaxi quando chegou a garota “M” de
16 anos, sua mulher. Ali no sítio tudo se resolve fácil.
Ela disse para Jardiel que um cara tinha ficado de graça com
ela, tentando estuprá-la. Pronto, acabou a paz de Jardiel, o sangue ferveu na
hora. Ele voltou para casa e encontrou Ednaldo Melo, o suposto garanhão.
A garota “M” viu que a coisa ia ficar braba e aproveitou
para atiçar Jardiel, e pediu uma prova de amor; “se você me ama mata ele. Sempre
quis ver um homem morrer”. Isso soou como um pedido e uma ordem. Jardiel,
danado da vida puxou Orelhinha para um canto e foi tirar satisfações.
Orelhinha era morador de Guarabira e, talvez, não conhecesse
a fama de Jardiel. Ali no mato, perto da casa de Jardiel começaram a discutir;
este enfurecido pegou Adnaldo e desfechou uma facada em seu pescoço. Em
seguida, descontrolado deu mais de 20 facadas, na boca, no rosto, e no umbigo.
Orelhinha caiu, mas não morreu. Tinhoso como bom sertanejo
ainda pode desafiar Jardiel: ”Se você não me matar agora, quando ficar bom eu
volto, pego a sua mulher e levo a sua cabeça”, conta os relatos da imprensa. Como
o pobre não morria, como se zombasse de si, Jardiel resolveu enterrá-lo vivo.
Chamou a sua mulher e uma irmã e arrastaram o corpo até um
mato, onde ele o enterrou vivo.
Quando a polícia apareceu no sítio, atrás dele, Jardiel tentou
fugir, mas foi preso. Foi seu pai quem chamou a polícia.
Absolutamente frio, disse a quem quisesse ouvi-lo que se Orelhinha
aparecesse outra vez diante dele, o mataria de novo. Não está arrependido. E
disse que quando o esfaqueou tinha ficado com vontade de comer seu fígado.
A sua mulher, usuária de drogas, também muito fria, disse
que nunca havia visto matarem um homem, por isso pediu essa prova de amor a
Jardiel. Como ela tinha problemas com o pessoal do Conselho Tutelar, por conta
das drogas, já havia pedido, também, que Jardiel matasse um conselheiro de quem
ela tem raiva.
Mas não deu tempo, Pelé foi preso antes de fazer mais essa
vontade à sua amada.
O mal, meus caros, com certeza existe.
JARDIEL E “M” CONTAM A HISTÓRIA
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