CLAUDIA E CHAMPIGNON |
"Eu acho que as pessoas, em
algum momento da vida, perdem a fé. Independentemente se morrem por droga, ou
enforcadas. Se perdem a vida sem culpa de ninguém, acredito que em algum
momento perderam a fé", acrescentou o baixista Champignon.
Essas palavras foram ditas
a repórteres do G1 em maio, quando o guitarrista Peu, seu ex-colega no grupo
Nove Mil Anjos, foi encontrado morto, em Salvador, Bahia. Chorão morreu por
overdose, Peu enforcado.
É uma visão bastante trágica sobre a
vida. E carregada de mistério também. Será que sempre que se perde a fé se
perde a vida? A vida, embora tensa, pode ser longa, chegando a morte quando ela
deve chegar; isto é, quando Deus, ou o Destino, assim o quiserem.
Alguém
poderia objetar que, quando alguém resolve tirar a própria vida, de certa
forma, isso também faz parte do Destino, ou da vontade de Deus. Pode ser, quem
sabe?
Mas a vida das pessoas, de modo
geral, é mais longa que os 35 anos de Champignon. Então, ele resolveu dar fim a
tudo.
A que tipo de fé teria se referido Luiz
Carlos? A fé em algo transcendente, que alimenta a alma? Como crer em Deus e
estar ligado a uma religião, ou ter sentimentos religiosos que o apóiem em
momentos de crise? A fé em si mesmo, na força interna, apesar dos percalços e
dos tropeços, de onde se tira a energia para continuar?
A fé no próximo, que pode ser o alvo e o
destino de nosso esforço para viver e produzir mais e melhor?
Essa uma questão que, acredito, ninguém
possa, de fato, responder. Somente Champignon poderia explicar melhor o que
pretendeu dizer quando perdeu seus amigos. O fato é que a morte de Chorão e a
de Peu o abalaram fortemente. Não há a menor dúvida sobre isso.
A vida é um círculo que se expande,
até que um dia chega ao seu limite; aí conhecemos a morte. Ela sempre está
ali, na fronteira, na divisa, no outro lado daquela tênue linha. Nem sempre
esse caminho é reto e tranqüilo. A vida é cheia de surpresas e pressões, e nem
sempre é fácil lidar com elas.
Dizem as informações publicadas pela
imprensa que Champignon e sua mulher, Claudia Campos, que moravam em São Paulo, haviam ido
jantar, com um casal amigo, em um restaurante do Morumbi, de comida japonesa. Ali, além da refeição, ele teria tomado duas garrafas de 750 ml cada de saquê.
Cláudia contou à delegada (que conversou
um pouco com ela na madrugada de ontem - segunda -, após a morte de Champignon),
que eles tiveram uma discussão, uma briga, no restaurante. Segundo as informações,
voltaram para casa em silêncio.
O síndico do Condomínio Edifício
Morumbi Park, na rua Doutor Luiz Migliano, onde moravam, disse que a fita do
sistema de vigilância mostrava a chegada de Champignon e Cláudia ao prédio sem
estarem de mãos dadas, caminhando lado a lado, aparentemente sem se falar.
O síndico disse também, antes de
entregar a fita à Polícia, que o músico, olhando para a câmara, teria feito um
gesto agressivo com uma mão. Mas não quis dizer qual foi o gesto, deixando esse
detalhe para a delegada que atendeu o caso.
Mais tarde foi divulgado,
informalmente, que o gesto foi o de levantar o braço à altura do pescoço e
passar a mão espalmada de um lado a outro, como o gesto de corte com uma lâmina. Um gesto de degola.
Talvez tenha sido este, então, o primeiro sinal claro da intenção de por fim à própria
vida.
Ao chegar no seu apartamento, Luiz
Carlos dirigiu-se a um quarto que havia sido transformado em estúdio e fechou a
porta. Foram ouvidos dois estampidos. Um deles, soube-se depois, foi em direção ao chão, como se
estivesse testando a pistola calibre 380. O outro foi contra a própria boca, segundo os relatos da imprensa.
Champignon morreu na hora. Por algum
motivo só dele, secreto, especial, que talvez nem sua mulher possa explicar, e
nem compreender, jamais, ele preferiu ultrapassar aquela linha tão fina, tão tênue,
tão invisível, que nos coloca do outro lado; de onde é impossível voltarmos. É certo que as críticas feitas ao novo grupo A Banca e a ele o chateavam, desanimando o artista. Pessoas próximas a ele disseram que andava meio deprimido.
Champignon quis passar para o outro lado da fronteira, para o nosso maior mistério, aquilo que nos assombra tanto: a morte.
Talvez a escolha do restaurante
japonês tenha sido meramente casual, talvez simbólica. Quem poderá dizer? Teria sido uma escolha
pessoal de Champignon?
Após os saquês, como um samurai da música,
Champignon cumpriu o ritual dos antigos guerreiros japoneses, mas não usou a
famosa lâmina afiada chama “tanto”, a espada curta com que os antigos faziam o “seppuku”
(harakiri), cerimonial suicida.
Mas o gesto no elevador foi carregado de significado e simbolismo. Naquele momento ele, com certeza, já havia tomado a mais importante e, tristemente, a mais séria e irreparável decisão de sua vida.
Champignon decidiu-se por uma única
moderna e rápida bala.
Luiz Carlos Leão Duarte Junior
deixou uma filha de sete anos, de um primeiro casamento. Deixou Cláudia, a sua atual
mulher, grávida de uma criança de cinco meses. Ele deixou milhares de fãs,
ele deixou muitos amigos, e ex-companheiros de banda. Ele deixou a música. Deixou seus familiares. Deixou tudo isso. Ele deixou a própria vida.
Teria Luiz Carlos
Leão Duarte Junior, o Champignon, perdido a fé?
A última fala de Cláudia para Champignon, tarde demais, pouco depois da meia noite, foi quando ela ouviu os estampidos: "Você não fez isso, amor!".
Mas ele havia feito, sim. Teria ele perdido a fé?
Imagens: Facebook
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