Quando Roberto Jefferson dirigiu-se a José Dirceu e falou
sobre instintos primitivos, os petistas chegaram a pensar que o mandato de Lula
estivesse em risco. Mas a oposição, fraca de dar dó, e a imprensa corroída por
verbas publicitárias oficiais e pelo deslumbramento de jornalistas esquerdistas para com o
governo popular, nada fizeram.
A idéia de um partido salvador, cumprindo uma espécie de
missão divina, perpassa o PT e sua mitologia. É um partido organizado e
voltado, desde o seu início, a buscar uma hegemonia tal que se confundiria com
o Estado e o Governo. Tem uma ideologia totalitária.
Assim sendo, embora use a imprensa como um estilingue para
atirar pedras no telhado de vidro dos adversários, ou use a promotoria pública
para canalizar suas demandas, detesta e abomina quando a imprensa e a
promotoria investigam seus próprios atos.
Há anos ouve-se falar, também, nos tais movimentos sociais.
Tais movimentos, de modo geral, nada tem de espontâneos. São criados por meio
da canalização de demandas de grupos e minorias e instrumentalizados
politicamente. Isto é, dificilmente a sociedade se auto-organiza. Aliás,
sociedade é uma abstração. Então, quando surgem movimentos sociais, são apenas
grupos de pessoas teleguiadas, dos bastidores, por partidos políticos. O PT
controla diversos. É histórico.
Assim, com o prosseguimento do julgamento do Mensalão pelo
STF, e com as condenações que pareciam impossíveis no imaginário dos que se
julgam acima das leis, pois seriam os detentores de toda a razão do mundo, os
petistas dão demonstrações, a cada dia mais evidentes e fortes, de que a
democracia como a temos é, para eles, apenas um momento a ser ultrapassado.
Se algum petista é julgado é perseguição. Tudo o que fazem é
certo, mesmo o errado, pois estaria imbuído, impregnado de boas intenções.
Chegamos ao ponto de vermos lideres do PT questionarem a transmissão ao vivo do
julgamento do Mensalão pela TV Justiça! Lemos que a transmissão seria
antidemocrática!
Fico imaginando um julgamento semelhante, no STF, em que Paulo
Maluf (agora aliado do PT), um líder qualquer tucano, ou alguém que não fosse
do PT, estivessem na berlinda. Seria bom ou não para os petistas a transmissão
de tal espetáculo? O que diriam
caso alguém quisesse suspender as transmissões?
Gutenberg J.
Assim, dou toda razão a razão a José Roberto Guzzo, que
publicou o seguinte artigo na última página da última edição de VEJA:
SÓ COM CENSURA
José Roberto Guzzo
Para o seu próprio sossego pessoal, o ex-presidente Lula,
seus fãs mais extremados e os chefes do PT deveriam pôr na cabeça, o mais
rápido possível, um fato que está acima de qualquer discussão: só existe um
meio que realmente funciona, não mais que um, para governos mandarem na
imprensa, e esse meio se chama censura.
Infelizmente para todos eles, essa é uma arma de uso
privativo das ditaduras — e nem Lula, nem o PT, nem os “movimentos sociais” que
imaginam comandar têm qualquer possibilidade concreta de criar uma ditadura no
Brasil de hoje. Podem, no fundo da alma, namorar a ideia. Mas não podem, na
vida real, casar com ela. Só perdem seu tempo, portanto, e se estressam à toa
quando ficam falando que a mídia brasileira é um lixo a serviço das “elites”;
há dez anos não mudam de ideia e não mudam de assunto. Bobagem.
O que querem mesmo é impedir que esta revista (VEJA), por
exemplo, publique reportagens como a matéria de capa de sua última edição, com
as declarações de Marcos Valério sobre o envolvimento direto de Lula no
mensalão. Ficam quietos porque têm medo de que sejam publicadas as fitas gravadas
com tudo aquilo que ele disse, e as coisas piorem ainda mais. Mas o seu único
objetivo real é este: eliminar as informações que desejam esconder.
Até agora, o plano mais ambicioso que lhes ocorreu para
chegar aonde querem foi propor algo que chamam de “controle social” da mídia:
não conseguem explicar bem o que seria isso na prática, mas nem é preciso que
expliquem. O problema do PT, nessa história toda, é simples: “controle social”
é algo que não existe no mundo dos fatos. Na vida como ela é, só têm controle
verdadeiro sobre um órgão de imprensa os seus proprietários ou, então, o
departamento de censura.
Todo o resto é pura tapeação. Mas é isso, exatamente, que o
PT propõe. Já foi feita, de 2003 para cá, uma boa meia dúzia de tentativas para
armar o tal controle, primeiro com projetos de lei que morreram antes de
nascer, depois com “audiências públicas” e outras esquisitices. Não saiu, até
agora, um único coelho desse mato.
Falou-se também da “mobilização de setores populares” para
pressionar a mídia, mas não se conseguiu mobilizar ninguém. Manifestações de
massa, para o PT de hoje, exigem ônibus fretados, lanches grátis, patrocínio de
alguma estatal — e, francamente, não é assim que se faz uma revolução. Muito
dinheiro do Erário tem sido gasto na compra do apoio de uma parte da imprensa,
através de verbas publicitárias e outros tipos de ajuda: o problema, aí, é que
o governo não consegue comprar os veículos que têm mais público. Foram criadas,
também, brigadas de “blogueiros” que recebem uma espécie de “mensalinho” para
falar a favor do governo e contra quem faz críticas a ele; ninguém parece
prestar atenção no que dizem.
Inventou-se, ainda, uma “TV Brasil”, emissora que serve para
apoiar as autoridades e é sustentada com dinheiro público em estado puro. Em
cinco anos de funcionamento, sua audiência continua vizinha do zero; a esta
altura, talvez tenha mais funcionários do que telespectadores. A questão, em
todos esses casos, é que imprensa a favor não adianta nada — o que interessa a
quem manda é não ter imprensa contra. Elogios não salvaram uma única cabeça,
entre os doze ministros que a presidente Dilma Rousseff botou na rua até agora,
nos casos em que foram denunciados por corrupção no noticiário. Não têm
resolvido nada no julgamento do mensalão, também revelado integralmente pelo
trabalho da imprensa; o STF vem sendo o flagelo de Deus para os réus,
triturados um após o outro com sentenças de condenação.
Ditaduras entendem muito bem como se controla a imprensa.
Não desejam aplausos: a única coisa que lhes importa é cortar tudo aquilo que
não querem que seja publicado. Não podendo fazer isso, o PT fica na gritaria.
Ainda há pouco, o presidente nacional do partido, deputado Rui Falcão, disse
que a “mídia conservadora” é instrumento de uma “elite suja e reacionária”, e
fez uma ameaça: “Não mexam com o PT”. E se mexerem — ele vai fazer o quê?
As coisas que o deputado diz não chegam a obter a nota
mínima necessária para ser levadas a sério: não há exemplo na história de
situações em que a imprensa tenha mudado de linha por causa de discurseira
desse tipo, ameaças vazias ou “pressões da sociedade”. Veículos independentes
não têm medo de insultos, “setores populares” ou líderes políticos com
popularidade de 80%; o que lhes quebra a espinha é a força armada, e só ela. É
melhor, então, o PT segurar a ansiedade.
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