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sábado, 5 de outubro de 2013

PAULO FREITAS, A MORTE EM ITANHAÉM E O SEGREDO DO FRASCO DE PERFUME. Foi sepultado na sexta-feira (4), em Santos, o repórter-fotográfico que desapareceu há uma semana, no Litoral Sul de São Paulo. A polícia prendeu o suspeito pelo assassinato (réu confesso), Ronaldo da Silva, ex-detento e usuário de drogas.




PAULO FREITAS

“Der tod dass ist die khüle nacht” (H.Heine) 


Ninguém sai de casa para morrer. Paulo Freitas, 57 anos, saiu de sua casa, em Santos, na manhã de sábado, 28 de setembro, para voltar no domingo. Nunca mais voltou. Ao menos vivo, nunca mais voltou. Ele foi sepultado em Santos, na última sexta-feira à tarde. Restará para sempre uma última e dolorosa pergunta: por quê? Talvez seja uma daquelas perguntas sem resposta.

A vida pode ser curta ou longa, reta ou tortuosa, ninguém sabe, mas ali, do outro lado da fronteira, está a morte à espreita. E sempre foi assim. De certo modo, além de todas as precauções, da proteção de Deus, do Anjo da Guarda, das rezas e mandingas, talvez estejam em eterna disputa pela pobre alma a Sorte e o Azar. 

Sempre foi assim, e sempre será.

Costumam dizer, até, que Deus escreve certo por linhas tortas. Quem sabe?

A escuridão sempre foi temida. A escuridão é o avesso da luz. A morte é a noite fria, escreveu o poeta romântico alemão Heine. Paulo Freitas chegou a Itanhaém à luz do sol, mas não escapou da noite fria.

Conta a imprensa regional que o fotógrafo, que trabalhou por quase três décadas no jornal A Tribuna (Santos), onde deixou muitos amigos, planejava entregar uns documentos, talvez uma escritura, a um casal de aposentados que lhe comprara um sítio num bairro da periferia de Itanhaém, Vila Gaivota, na estrada do Rio Preto, onde há ainda muitas matas, silêncio e a completa escuridão da noite.

Certamente ele passou por lá, pois a esposa do comprador contou à polícia que conversaram um pouco e, como o marido dela não estava em casa, Paulo resolveu voltar mais tarde para acertar as pendências. “Volto mais tarde para tomar um café”, teria dito o fotógrafo à mulher. Mas não voltou.

UM DOS LOCAIS POR ONDE PAULO E AMIGOS TERIAM PASSADO (TV Tribuna)
 
O lugar é pobre, com muitas casas inacabadas, mato para todo lado, pássaros, cigarras noturnas. Poças d´agua, atoleiros. Botecos. Diversos botecos com a inevitável mesa de bilhar e o balcão ensebado e cansando de ouvir as sempre mesmas histórias de trabalho, desamores, e valentia.

Balcões de boteco são como ouvidos de psicanalista. As pessoas falam, falam, bebem, bebem, aliviam o coração e a alma e vão dormir anestesiados, prontos para o dia seguinte. Talvez os botecos sejam mais baratos que os divãs.      

Segundo as narrativas da imprensa, Paulo passou algumas horas em um boteco perto do campinho de futebol, no Jardim Palmeiras. Por ali estava uma moça, conhecida dele, para quem ele havia prometido fazer umas fotos de seus filhos pequenos. As fotos, pelo que se sabe, também jamais foram feitas. Paulo não teve tempo.

No boteco estariam diversas pessoas, entre elas Ronaldo da Silva, 38 anos, irmão da moça amiga do fotógrafo, a quem ele foi apresentado. Após muita conversa e bebida a moça foi embora, isso já no início da noite.

Paulo, Ronaldo e mais alguns sujeitos ficaram conversando. Dali, ao menos Paulo, o novo amigo e mais um homem, ainda não identificado pela polícia, resolveram ir a outro lugar, ali por perto, onde haveria música.

Os relatos indicam que provavelmente o último lugar visitado foi um tipo de boate, meio inferninho, “puteiro” como se costuma dizer de lugares freqüentados por garotas de programa, Rosa Negra. Os que identificaram as fotografias disseram que por ali ficaram pouco tempo, sem nada consumir.

A família do fotógrafo comunicou o seu desaparecimento ainda no domingo, uma vez que não conseguiam contato. Na terça-feira à noite foi localizado o carro de Paulo Freitas, estacionado em uma rua de Mongaguá, cidade a 20 quilômetros de Itanhaém. O carro, um Ford Fiesta preto estava sem as chaves, o rádio e o pneu estepe haviam sido levados. No porta-malas estavam algumas roupas e um galão de gasolina vazio.

Na quarta-feira a polícia informou haver encontrado uma calça (com cinto) de Paulo Freitas, no lixo da casa irmã de Ronaldo. Junto com essa calça havia outra calça, molhada. Segundo a moça, ela havia jogado as duas calças no lixo porque as encontrou no quintal no domingo, depois que acordou. Ela contou que havia bebido demais no sábado e dormiu, não se lembrando de nada no outro dia.

Ela disse que jogou as calças fora porque pensou que fossem de seu irmão. Algo meio esquisito, concordam? Não seria mais óbvio guardá-las e entregá-las a Ronaldo quando ele aparecesse por ali?

Talvez o delegado de Itanhaém tenha pensado o mesmo, pois levou a moça à delegacia e quando ela ligou ao irmão para conversar o delegado e investigadores ouviram, pela escuta, ele dizer, depois de ser questionado pela moça, que havia dado um fim no fotógrafo.

JARDIM ANCHIETA

Na quarta-feira, ao anoitecer, Ronaldo foi preso em Peruíbe, município 20 quilômetros ao sul de Itanhaém, quando, segundo relatos, tentava livrar-se do equipamento fotográfico de Freitas. Na quinta-feira a polícia localizou o corpo do fotógrafo jogado em uma vala perto do quilômetro 335 da Rodovia Padre Manoel da Nóbrega, junto ao Jardim Anchieta, não muito distante do Balneário Gaivota.

O que teria acontecido nas horas entre a saída do Rosa Negra e o fim na vala à beira da estrada? Ninguém sabe, ainda, com certeza. O delegado tentará reconstituir tudo o que aconteceu durante o tempo da prisão preventiva de Ronaldo da Silva, para que o inquérito seja encaminhado à Promotoria. Ronaldo será enquadrado ou por latrocínio (roubar e matar) ou morte seguida de roubo, além de ocultação de cadáver.

A morte é uma noite fria. 

Naquele fim de noite, ou começo de madrugada, Paulo Freitas já estava bastante alcoolizado, assim como Ronaldo e outras pessoas. Teriam saído os três do inferninho em direção a algum outro lugar, em busca de diversão, segundo os relatos da imprensa.

O fato é que talvez não tenham chegado. Ronaldo conta que dirigiu o carro, pois o fotógrafo estava sem condições de fazê-lo. Não se sabe ainda se o outro sujeito que os acompanhava continuava no carro.
 
RONALDO SILVA (TV TRIBUNA)

Por algum motivo discutiram, brigaram, e Ronaldo conta que jogou Paulo contra o acento do carro e o asfixiou, até o desfalecimento. Paulo Freitas foi encontrado na vala à beira da estrada, onde esteve por cinco dias. "Eu joguei ele para o banco e dei um sufoco nele".

O suspeito disse à polícia que não roubou nada do profissional e apenas se defendeu. O laudo técnico do IML informa hoje (5) que Paulo Freitas morreu por esganadura. Foi jogado morto na vala. 

"Eu não queria dinheiro, eu tenho dinheiro, eu trabalho. Eu não queria nada com ele. Estou arrependido", disse Ronaldo.

No porta-malas do veículo junto às outras coisas encontradas estava uma pequena e silenciosa testemunha do que aconteceu naquela noite, de modo que tudo acabasse em morte: um pequeno frasco de perfume.

Mas frascos de perfume não falam.

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